LITERATURA FRENTE AS MUDANÇAS SOCIAIS PROVOCADAS PELA PANDEMIA

LITERATURA FRENTE AS MUDANÇAS SOCIAIS PROVOCADAS PELA PANDEMIA



Humberto Lima

O ser humano é, antes de mais nada, um animal social, e até mesmo por esse motivo, ao ficarmos presos dentro de nossas casas nesse evento que a nossa geração nunca pensou viver, o risco não é apenas a nossa saúde física, visto o coronavírus ser uma espécie de roleta russa, matando em todas as idades e classes sociais, mas também nossa saúde mental. 

Nesse momento perdemos algo do que nos torna essencialmente humanos: a capacidade de podermos interagir livremente com outros humanos. Agora andamos de máscaras, olhos desconfiados observando uns aos outros como animais confinados que procuram o mal invisível contido uns nos outros.

Testas quentes, olhos vibrantes e febris. Uma tosse ou um espirro. Tudo nos leva a fugir do contato direto e nos refugiarmos dentro de nós mesmos em nossas casas, como castelos modernos, fugindo de uma hipotética "Máscara da Morte Rubra", de Edgar Allan Poe.

Com o advento da internet o que imaginamos que seria um elo, acabou nos afastando ainda mais uns dos outros.

Hoje conversamos com mais facilidade com aquelas pessoas afastadas no nosso convívio social, do que com aquele vizinho que conhecemos desde nossa infância. Apesar da alta tecnologia na forma de tablets, smartphones e outros equipamentos de última geração, nossas mentes e corações ainda são analógicos.

O COVID-19 apenas expôs algo que já sabíamos: o homem está perdendo sua capacidade de convívio social.

Talvez alguém me censure e diga "Mas e os livros?", são muito mais antigos que as redes sociais e nem por isso dizíamos que o homem se isolava antigamente.

Esse argumento não é válido, pois a leitura concentra em si, a capacidade de fazer a pessoa viajar sem se deslocar. Além de ao mesmo tempo distrair, acalmar, encantar, empolgar e nos levar a uma infinidade de outros sentimentos gerados por nós mesmos no ato da leitura. 

As pestes e epidemias acompanham o homem desde sua jornada através da animalidade até o verniz superficial de civilização que ostentamos sobre a pele, em sorrisos polidos e fajutos, quando não podemos nos atracar uns aos outros como feras. Livros dos mais variados gêneros têm tratado do assunto e podem ser um norte para como o ser humano pode sobreviver em situações extremas.

No livro "A Máscara da Morte Rubra", Poe (1809 - 1849) se utiliza da parábola de um país distante assolado por uma peste mortal e seu governante (o príncipe) fecha as portas de seu castelo, entregando-se a luxúrias sem fim onde tudo era permitido. Tudo? Mesmo no antro de devassidão, ostentar no rosto a morte rubra, mesmo que como brincadeira, era punivel com a morte. 

No livro, o "Cavaleiro do Telhado e a Dama das Sombras", do italiano Jean Giono (1895-1970) se passa no contexto de uma epidemia de cólera entremeado a revolução na Itália na primeira metade do do século XIX, onde uma mulher busca seu marido e um homem honrado busca abandonar a França entregue ao caos para participar da revolução em seu país de origem

O livro "A peste" de Albert Camus (1913 - 1960) nos transporta para uma epidemia de peste que começa com um prosaico rato morto na Argélia, evoluindo para um cenário onde o horror e a grandeza da humanidade são testadas até seu limite.

Mais recente, podemos citar o gigante escritor José de Saramago (1920 -2010) com seu "Ensaio sobre a Cegueira", onde uma cegueira branca toma gradualmente a humanidade levando as pessoas a escolhas que variam entre o abjeto até a abnegação em prol uns dos outros. 

Não necessariamente temos a alta literatura que nos fala sobre vírus, bactérias e germes. No livro "A história da humanidade contada pelos vírus: bactérias, parasitas e outros microorganismos", de Stefan Cunha Ujvari, em um relato mais técnico que lírico, conta sobre nossa relação errática com essas criaturas invisíveis muitas vezes fatais.

O que temos em comum em todos esses livros? O homem pode se sobrepor ou decair ante as epidemias, dependendo de como ele reage a ela. São livros mais do que necessários para não decairmos na desumanização nesse momento tão crítico que vivemos.

Se reconecte com sua humanidade. Leia.

"Pensar enlouquece, pense nisso"


Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Falou, e falou muito bem.
    Nunca estivemos tão antissociais. Parabéns pelo artigo

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  3. Sempre digo que a base para um excelente texto é a pesquisa.
    Parabéns, querido, Humberto amo a sua escrita.

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